Análise da obra "Olhai os lírios do campo"
Olhai os lírios do campo de Érico
Veríssimo
Análise da obra
Olhai os
lírios do campo é um dos mais famosos de Érico Veríssimo e foi publicado em
1938 – Segunda fase do Modernismo.
A ambientação
urbana da história dá margem à abordagem dos efeitos de um capitalismo
devastador sobre a vida dos personagens. O romance narra a trajetória
existencial do personagem principal, Eugênio, seus contatos sociais e seus
dilemas interiores. Portanto, a narrativa centra-se em seus conflitos e
vicissitudes.
Nesta obra
deve-se destacar o lirismo romântico da história de Eugênio, descobrindo que o
dinheiro não traz felicidade, exatamente nos moldes do romance urbano de 30, de
caráter socialista. Destaca-se também sua ambição traçada a partir de uma vida
difícil, que o alimenta de amargor e determinação na busca de sua afirmação
material. E ainda, o grande sucesso dessa dramática história de amor, pode ser
creditado à habilidade do autor de construir personalidades psicológicas
complexas: ninguém é só bom nem só ruim na obra.
Para retratar
essa relação problemática do homem com a sociedade, Érico Veríssimo construiu o
romance Olhai os lírios do campo de maneira que o personagem principal
fosse mostrado em dois momentos. No primeiro momento, ele é conduzido, em seus
comportamentos, pelas expectativas sociais; obedece aos valores de sua classe,
é incapaz de perceber-se enquanto ser. Ele faz de tudo para ter sucesso e ser
aceito: trabalha em função de uma máscara e não do próprio rosto. No segundo
momento, o romancista mostra os processos de transformação de Eugênio: da
condição de indivíduo coisificado, guiado mais pela expectativa dos outros do
que por si mesmo, para a condição de indivíduo autônomo e consciente de si,
sujeito de suas próprias decisões.
A narrativa,
portanto, se divide em duas partes com 12 capítulos cada uma, sendo a primeira
o cruzamento de dois níveis temporais: o presente e o passado. Assim, nesta
narrativa de vários planos temporais, entrelaça-se uma crítica à sociedade
fútil e vazia, ao acúmulo de riquezas e à consequente hipocrisia das relações
sociais. A primeira parte é intensa e cheia de um interesse que jamais
enfraquece. Na segunda parte, porém, esse interesse declina, e a história se
dilui numa série de episódios anedóticos sem unidade emocional.
AMBIENTE
O ambiente do
romance é a cidade de Porto Alegre. As personagens vivem na metrópole de ruas
movimentadas, tráfego intenso, automóveis, telefones, cinemas e teatros;
edifícios altos, gente rica, monopólios; gente pobre, sindicatos, miséria e
doença. Vivem os movimentos da contradição e da crise
FOCO
NARRATIVO
Toda a
narrativa é formalmente estruturada na terceira pessoa a partir de um ponto de
vista do narrador.
Personagens
Eugênio Fontes: homem profundamente pessimista, infeliz e complexado. Profissão: médico. Filho de um alfaiate pobre, Eugênio teve uma infância e adolescência cheias de dificuldades. À medida que ia crescendo, nutria um misto de vergonha e repúdio a si mesmo em decorrência da pobreza de sua família. Sua motivação era "ser alguém", adquirir posição social e não ter que passar pelas humilhações que julgava ter passado na infância. Na faculdade, conhece uma jovem, Olívia, pela qual se apaixona e nutre um relacionamento de amizade, cumplicidade e amor. Porém, devido a sua ambição, Eugenio deixa Olívia para casar-se com uma jovem rica. Passa a viverem uma vida de aparências, adultérios e eternas contradições, deixando para trás seu verdadeiro amor e a filha Anamaria.
Eugênio Fontes: homem profundamente pessimista, infeliz e complexado. Profissão: médico. Filho de um alfaiate pobre, Eugênio teve uma infância e adolescência cheias de dificuldades. À medida que ia crescendo, nutria um misto de vergonha e repúdio a si mesmo em decorrência da pobreza de sua família. Sua motivação era "ser alguém", adquirir posição social e não ter que passar pelas humilhações que julgava ter passado na infância. Na faculdade, conhece uma jovem, Olívia, pela qual se apaixona e nutre um relacionamento de amizade, cumplicidade e amor. Porém, devido a sua ambição, Eugenio deixa Olívia para casar-se com uma jovem rica. Passa a viverem uma vida de aparências, adultérios e eternas contradições, deixando para trás seu verdadeiro amor e a filha Anamaria.
Olívia: grande amor de
Eugênio e colega de trabalho. Olívia é mais uma das clássicas figuras femininas de
Érico, que transparece doçura e compreensão frente às inquietudes dos
personagens masculinos, mas que não esconde uma grande força e determinação.
Assim como Eugenio, Olívia cursa a faculdade de medicina em Porto Alegre com
dificuldades. A sua visão realista e compreensão do comportamento humano fazem
com que ela encare seu relacionamento com Eugenio de forma honesta, entendendo
as limitações que este poderia ter em virtude da ambição e das eternas contradições
emocionais do médico. Olívia também pode ser encarada, de certa forma, como uma
representante feminista de Erico, pois apesar de aceitar as limitações de
Eugenio, ela luta em manter a carreira de médica e cria a filha Anamaria sozinha.
Eunice: esposa de Eugênio.
Rica, fútil e vazia. Filha do empresário Vicente Cintra conquista Eugênio com
sua fortuna, casando-se com ele e se tornando a oportunidade de que o médico
necessitava para se destacar na sociedade.
Ângelo: pai de Eugênio. O
próprio Eugênio nos revela pormenores sobre seu pai e seus sentimentos para com
ele:
Eugênio
viu um vulto familiar surgir a uma esquina e sentiu um desfalecimento.
Reconheceria aquela figura de longe, no meio de mil... Um homem magro e
encurvado, mal vestido, com um pacote no braço, o pai, o pobre Ângelo. Lá vinha
ele subindo a rua. Eugênio sentiu no corpo um formigamento quente de mal-estar.
Desejou - com que ardor, com que desespero! - que o velho atravessasse a rua,
mudasse de rumo. Seria embaraçoso, constrangedor se Ângelo o visse, parasse e
lhe dirigisse a palavra. Alcibíades e Castanho ficariam sabendo que ele era
filho dum pobre alfaiate que saía pela rua a entregar pessoalmente as roupas
dos fregueses... Haviam de desprezá-lo mais por isso. Eugênio já antecipava o
amargor da nova humilhação. Olhou para os lados, pensando numa fuga.
Inventaria um pretexto, pediria desculpas, embarafustaria pela primeira porta de loja que encontrasse. Ouvia a voz baixa e calma de Castanho... o "conceito hegeliano..." Podia entrar naquela casa de brinquedos e ficar ali escondido, esperando que Ângelo passasse... Hesitou ainda um instante e quando quis tomar uma resolução, era tarde demais. Ângelo já os defrontava. Viu o filho, olhou dele para os outros e o seu rosto se abriu num sorriso largo de surpreendida felicidade. Afastou-se servil para a beira da calçada, tirou o chapéu.
Inventaria um pretexto, pediria desculpas, embarafustaria pela primeira porta de loja que encontrasse. Ouvia a voz baixa e calma de Castanho... o "conceito hegeliano..." Podia entrar naquela casa de brinquedos e ficar ali escondido, esperando que Ângelo passasse... Hesitou ainda um instante e quando quis tomar uma resolução, era tarde demais. Ângelo já os defrontava. Viu o filho, olhou dele para os outros e o seu rosto se abriu num sorriso largo de surpreendida felicidade. Afastou-se servil para a beira da calçada, tirou o chapéu.
-
Boa tarde, Genoca! – exclamou.
O
orgulho iluminava lhe o rosto.
Muito
vermelho e perturbado Eugênio olhava para a frente em silêncio, como se não o
tivesse visto nem ouvido. Os outros também continuavam a caminhar, sem terem
dado pelo gesto do homem.
A sensação
de felicidade, entretanto, desaparecera de Eugênio. Sentia-se culpado. O que
acabara de fazer era desumano, ignóbil, chegava a ser criminoso. Por que se
envergonhava do pai? Não era um homem decente? Não era um homem bom? Não era,
em última analise seu pai?
Ainda
havia tempo de reparar o mal que fizera. Podia voltar, tomar Ângelo pelo braço,
carinhosamente, subir a rua com ele... Por que não fazia isso? "... aquele
trecho do Banquete..." - dizia Castanho. Sim, beijar a mão do pai,
confessar-lhe a culpa, dizer do seu remorso, pedir-lhe perdão, humilhar-se. Mas
lá se ia acompanhando os outros como um autômato. Voltou a cabeça, procurando.
Ângelo tinha desaparecido.
Dr. Seixas: amigo de
Eugênio e médico de pobres. Único personagem que tem características humanas.
Veríssimo pôs neste homem verdade: animou-o por dentro, deu-lhe reflexos,
deu-lhe instintos, deu-lhe uma maneira de ser de pessoa viva. Personagem
surgido “acidentalmente”, segundo o autor do romance, Dr. Seixas é um exemplo
de personagem autônomo. É um médico pobre, grande, barbudo e de ar agressivo.
Sua voz era igualmente áspera e peluda, sua fala desbocada, mas seus olhos
refletiam bondade. Idealista, ele critica tanto a exploração capitalista do
médico e o desprezo do sistema econômico pelo ser humano como o valor conferido
ao dinheiro: Seu Eugênio, ouça o que lhe digo. O dinheiro é uma coisa
nojenta. Um sujeito decente não se escraviza a ele.(p.183). Ele lutava
contra essa escravidão e pela igualdade de direitos entre as pessoas,
contagiando Eugênio e levando-o a uma nova concepção da profissão. O Dr. Seixas
encarna duas concepções de vida que mantêm entre si relações opostas: uma utópica,
confiante, e outra, pessimista. Para Dr. Seixas, sucesso era conseguir salvar a
vida de alguém e aliviar a dor dos outros. Ele reconduz Eugênio, como médico,
ao mundo da desigualdade e da pobreza, universo do qual ele, como profissional,
sempre tentara fugir.
.Anamaria: filha de
Eugênio e Olívia. Ela ajuda a manter viva na lembrança de Eugênio a presença de
Olívia e, ao mesmo tempo, como criança que é, sinaliza para a esperança e a
confiança de que o futuro pode ser diferente. Anamaria simboliza a insistente
afirmativa de Olívia de que a vida é feita de recomeços. A menina tem os olhos
sérios e profundos de Olívia e, ao mesmo tempo, desconfortáveis como os do
pobre Ângelo, pai de Eugênio. Sua presença retoma duas figuras diante das quais
Eugênio precisa se redimir: seu pai, que foi por ele desprezado, e a própria
Olívia, que ele abandonou por um casamento de conveniência. A presença da filha
suscita-lhe interrogações e o obriga a tomar decisões sensatas e responsáveis
para com os outros. Anamaria lhe permite uma compreensão da miséria humana e da
necessidade de que o conjunto das ações dos homens seja orientado para
minimizá-la.
Observação: Devemos destacar que a dedicação, o altruísmo e a nobreza de Olívia parecem inumanos. Não convencem. Pouco convincente também é a covardia de Eugênio. A cena em que o vemos a fazer a sua primeira operação, do ponto de vista da mera redação, está razoavelmente bem feita; do ponto de vista da verdade psicológica, porém, é um absurdo. Um homem de estômago fraco e que tem horror ao sangue jamais se dedicaria à cirurgia e, se se dedicasse, com o tempo acabaria por habituar-se a cortar a carne dos pacientes sem que isso lhe provocasse arrepios, náusea ou medo. Acaso não teria ele, como estudante, frequentado o necrotério e os ambulatórios da Santa Casa?
Observação: Devemos destacar que a dedicação, o altruísmo e a nobreza de Olívia parecem inumanos. Não convencem. Pouco convincente também é a covardia de Eugênio. A cena em que o vemos a fazer a sua primeira operação, do ponto de vista da mera redação, está razoavelmente bem feita; do ponto de vista da verdade psicológica, porém, é um absurdo. Um homem de estômago fraco e que tem horror ao sangue jamais se dedicaria à cirurgia e, se se dedicasse, com o tempo acabaria por habituar-se a cortar a carne dos pacientes sem que isso lhe provocasse arrepios, náusea ou medo. Acaso não teria ele, como estudante, frequentado o necrotério e os ambulatórios da Santa Casa?
Enredo
Na primeira
parte destaca a imagem inicial que o personagem faz de si mesmo e os valores
que a engendram.
Em flashback,
temos o tempo presente: Eugênio dentro do carro em direção ao hospital para
reencontrar sua amada Eugênia, rememorando os fatos que fazem parte do seu
passado, onde, junto a ele, relembramos sua infância, seus traumas, seus
aprendizados com Olívia, o casamento com Eunice, a frustração, o sentimento de
se ter vendido para vencer.
Eugênio era
um menino tímido e medroso. Teve uma infância pobre, era ridicularizado na
escola e tinha como objetivo máximo a ascensão social, faria de tudo para um
dia vencer na vida. Achava que o que tinha era feio e sem graça, das roupas até
o seu próprio corpo. Não se entrosava com os demais colegas de classe e por
isso devotava todo o seu tempo aos estudos. Sonhava em deixar de ser
simplesmente o Genoca para ser o Dr. Eugênio Fontes.
Tinha pena do
pai, o alfaiate Ângelo, com quem não conseguia se comunicar facilmente. O seu
irmão, Ernesto, não se esmerava na educação e acabou perdido na vida. Com muito
esforço, Eugênio consegue cursar Medicina. Na Faculdade conhece Olívia - única
mulher da turma. Na festa de formatura os dois se aproximam e fazem sonhos e
confissões juntos, sobre o futuro. Tornam-se grandes amigos.
Durante a
revolução de 30, após uma operação mal sucedida no hospital militar, Olívia
convida Eugênio a sua casa e passam uma noite de amor. Dias depois, Olívia
recebe uma proposta para trabalhar em Nova Itália, e novamente se entrega aos
braços de Eugênio.
Durante um
atendimento médico, Eugênio conhece Eunice Cintra - filha de um riquíssimo
proprietário. Eugênio casa-se com Eunice com objetivo único de ascender
socialmente. O sogro trata de arranjar um emprego de fachada ("assinar
documentos") numa de suas fábricas. Eugênio começa a frequentar a alta
sociedade, mas não se sente parte dela. O seu complexo de inferioridade aumenta
ao ver os contrastes desse outro mundo, de emoções contidas, de meias-palavras.
Conhece pessoas como Filipe Lobo, construtor obstinado a construir o
"Megatério", um arranha-céu, mas não se importava com a família.
Infeliz e perturbado, Eugênio reencontra Olívia que lhe apresenta a sua filha,
fruto do último encontro dos dois, Anamaria. Ao chegar no Hospital onde estava
Olívia, recebe a notícias de sua morte.
Na segunda
parte, destaca-se o papel desempenhado pelo entrecruzamento de vozes que afetam
a imagem inicial do protagonista, conduzindo-o a uma progressiva mudança de
posição perante a existência.
Aqui temos o
passado. Esta segunda parte desenvolve-se de maneira mais linear, embora o
passado se misture ao presente da filha. Passa-se após a morte de Olívia e é
intercalada com a leitura das cartas que ela escreveu para Eugênio sem nunca
ter enviado. Eugênio toma coragem e separa-se de Eunice - apesar de todos os
inconvenientes sociais. Vai além, passa a ser um médico popular, com ideias de
socializar a medicina. Trabalha com o Dr. Seixas, um velho médico que sempre
atendeu aos pobres. A memória de Olívia, nas cartas, nas fotos ou no olhar de
Anamaria, o fortalece quando pensa nas dificuldades.
O médico tornou-se,
na sociedade atual, aquele mediador entre a ciência, a técnica e o sentimento
humanitário. Pensando primeiro em si mesmo, egoisticamente, Eugênio evolui para
a solidariedade, através das colocações de Olívia, que embora morta, é um
personagem presente no romance, fazendo contraponto com Eugênio.
http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros
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