Til de José de Alencar



"Til" - Análise da obra de José de Alencar

Estrutura do romance

A ação (cenário) de "Til" ocorre na Fazenda das Palmas, localizada na região de Campinas, interior do estado de São Paulo, e transcorre temporariamente a partir de 1826. Segue o clima do Folhetim em que os capítulos são curtos e terminam num momento de clímax. Além disso, a temática do suspense e do soturno são marcas registradas da obra, que é repleta de aventuras.
Trata-se de um romance Regionalista da escola literária do Romantismo, seu autor, José de Alencar busca mostrar a vida do Caipira do interior de São Paulo do século XIX, vocabulário e costumes da região - as celebrações de festejos como São João e Gongada -  as diferenças sociais da época (escravos, capangas, pobres e ricos donos de terras).
* Mostra-se o ambiente dos escravos e senzala e seus conflitos como a rivalidade entre duas negras, além da marginalização consciente dos escravos como Faustino e Monjolo, os quais conspiram para a morte de Galvão.
O livro é dividido em duas partes. A primeira serve como apresentação das personagens e das tramas e é nela que conhecemos Berta, personagem central do romance e típico arquétipo da heroína romântica. Nessa primeira metade da obra, o que mais chama a atenção é a contrariedade do comportamento de Berta (cujo apelido é Til): sempre movida por boas intenções, ela usa de sua influência e bondade para manipular as outras personagens.
Já na segunda metade do romance temos o desembaraço das tramas apresentadas e suas revelações. Os cenários deixam de ter uma descrição objetiva e material para adquirir um significado mais subjetivo, relacionado ao passado oculto das personagens. É nessa parte do livro que acompanhamos Berta em seu descobrimento sobre a morte de sua mãe e suas consequências. Em um final surpreendente, Berta abre mão de sua própria felicidade em prol das demais personagens.

Linguagem: as personagens se utilizam de expressões locais, próprias do ambiente rural paulista, sem necessária obediência à norma culta.

Foco narrativo
O romance é narrado em terceira pessoa e o narrador é onisciente neutro, ou seja, ele conhece todos os pensamentos e planos das personagens e os revela ao leitor, mas não há intromissões autorais diretas (o autor falando com uma voz impessoal, na terceira pessoa, dentro do próprio romance). A característica principal da onisciência é que o narrador sempre descreverá a narrativa, mesmo em uma cena, da forma como ele a vê, e não como suas personagens a veem.

Tempo
O tempo é predominantemente psicológico, ou seja, o romance não segue uma narrativa linear e o narrador manipula o tempo conforme as circunstâncias. Assim, o narrador pode ir ao passado e ao futuro sem obedecer às ordens do tempo cronológico.

Um retrato do Brasil rural do século XIX
A obra de José de Alencar pode ser dividida em quatro grupos. O primeiro deles, os romances indianistas, produziu grande parte das maiores obras, não só de sua carreira, como da literatura brasileira. Dentre elas, podemos citar "Iracema", "O Guarani" e "Ubirajara".
Já no segundo grupo, o dos romances históricos, encontram-se obras como "Minas de Prata" e "Guerra dos Mascates". O terceiro grupo nasce da vivência nas grandes cidades e da luta entre o espírito conterrâneo e a invasão estrangeira: são os chamados romances urbanos de Alencar. Dentre eles, podemos citar "Lucíola", "Diva" e "A pata da Gazela".
Por fim, temos o quarto grupo de romances do escritor: os romances regionalistas. Dentre as obras deste período, podemos citar "O Gaúcho", "O Tronco do Ipê" e "Til". Esta nova fase na obra de José de Alencar nasce da busca de uma nova identidade nacional. Após a independência política do Brasil, os escritores românticos param de buscar na figura idealizada do índio o modelo de brasilidade. Agora, o “ser brasileiro” não se encontra mais na floresta, entre rios e animais selvagens, mas sim nas cantigas do povo, nas fazendas e até mesmo na corte.
Assim, a literatura romântica teve um papel social importantíssimo no processo de independência do Brasil. Alencar, consciente da função social da literatura, buscou em seus romances traçar um retrato no tempo (romances indianistas e históricos) e no espaço (romances regionalistas e urbanos). Dessa forma, podemos dizer que "Til", como um dos mais destacados romances regionalistas de Alencar, é um retrato do Brasil rural do século XIX.
Porém, como autor romântico, Alencar não deixa de idealizar a realidade, em maior ou em menor grau, em todas as suas obras. Assim, tanto nos romances históricos, quanto nos indianistas e regionalistas, temos em comum o desejo de fuga da realidade presente para outros tempos e outros lugares mais felizes.
Da mesma forma, as personagens principais de Alencar (com exceção talvez dos romances urbanos) têm um porte heroico. São personagens inteiriças, que encarnam todas as virtudes físicas e morais do herói. Assim, a personagem central de Til também não poderia escapar desse arquétipo: Berta é a meiga e bela heroína, que atrai o carinho e a atenção de todos. Sempre com a decisão e força de todo bom herói, não mede esforços para conseguir realizar seus intentos e não hesita em se sacrificar pelo bem dos outros.
Outro ponto interessante que podemos tratar a respeito de Berta é que ela é um arquétipo das virtudes cristãs: a caridade, a solidariedade, a fraternidade, entre outras. Moça simples e bondosa, não tem nenhuma atitude estudada para ganhar proveito próprio. Sua influência sobre as demais personagens da obra são reflexo de personalidade franca e atenciosa. Dessa forma, Berta surge como elemento de ligação e fraternidade entre todos. Outro dado que sustenta esta interpretação é o fato de Berta ensinar rezas a Brás, sempre com a atitude compassiva própria de uma freira.
Em seus romances regionalistas, José de Alencar tenta caracterizar melhor os grupos sociais do Brasil do século XIX detalhando melhor alguns aspectos culturais. Dessa forma, vemos em Til os costumes, festas e comemorações dos negros, que dançavam animadamente nas senzalas, e do povo rural. Essa vivacidade da vida no campo contrasta diretamente com o abandono e marginalização que sofrem esse povo.
Apesar de Alencar defender uma ideia de que o campo é que é uma área propícia para se desenvolver uma cultura autenticamente brasileira, ele sabe que o futuro se dará nas cidades. Tanto que, ao final de Til, todas as personagens vão embora para a cidade e Berta, que em sua bondade resolve ficar para amparar os marginalizados (Jão, Brás e Zana), resta sozinha:
“Como as flores que nascem nos despenhadeiros e algares, onde não penetram os esplendores da natureza, a alma de Berta fora criada para perfumar os abismos da miséria, que se cavam nas almas, subvertidas pela desgraça. Era a flor da caridade, alma sóror”.

Personagens do Romance - Descrição 
 
* Berta, Inhá ou Til é a personagem central do livro, filha bastarda do fazendeiro Luís Galvão com uma pobre moça da vila (Besita que foi morta por vingança). Ela é o símbolo da heroína romântica idealizada, sua beleza é enfatizada por diversas vezes por José de Alencar. Foi criada por nhá Tudinha. Berta é uma adolescente muito bonita, graciosa, com movimentos espontâneos e encantadores, atrai para si o amor e carinho de todos, é caridosa e não se afasta das criaturas mais repulsivas e desprezadas da região (como Jão Fera, o louco Brás, e Zana). E’ chamada de Inhá por Miguel, e de Til por Brás durante uma aula que dava a ele, (Brás associava o sinal gráfico de nasalização  a alguns traços do rosto de Berta: as sobrancelhas, os lábios, a concha da orelha) já no fim do livro ela própria se intitula TIL, mostrando uma escolha que fará no romance.
Berta é sempre comparada a Flor, no capitulo inicial surge uma imagem de flor bela, mas imatura; já no fim do livro (no poente do sol) a imagem da flor se repete mostrando a “Flor Interior” cheia de caridade e abnegação. O autor cria assim uma ideia nítida de desabrochar, pelos trechos:
[Manhã: "Eram dois, ele e ela, ambos na flor da beleza e mocidade" e no Poente: "Era a flor da caridade, alma soror" ]
Berta sacrifica-se para que todos vivem em paz e felizes, faz com que Miguel e Linda fiquem juntos, e se resigna a cuidar dos que mais sofrem como Zana, Brás, Jão Fera (a quem ela reconhece como o seu verdadeiro Pai), a galinha sem pernas, etc, e continua morando com nhá Tudinha.

* Miguel é irmão de criação de Berta, filho de nhá Tudinha, jovem que se mostra desde o principio apaixonado por Inhá. Esta porém não percebe que o ama e faz de tudo para aproxima-lo se dua amiga Linda, que gosta de Miguel. Sendo pobre, Miguel não poderia casar-se com Linda, mas por fim ele acaba estudando para ascender socialmente e poder unir-se a Linda (o carinho que por ela “descobre” sentir foi pintado por Berta que colocou seu encanto na faces serenas da amiga).
* Luís Galvão é o dono da Fazenda Palmas, muito jovial e alegre, que na juventude foi homem de muitas aventuras amorosas e enrascadas – numa dessas desonrou Besita recém-casada com Barroso a qual ficou gravida de Berta – sempre protegido por seu camarada (“espécie de capanga”) Jão Fera.
* Linda é filha de Luis Galvão e D. Ermelinda, menina educada aos moldes da corte, mas que junto ao irmão Afonso faz amizade com os jovens simples Berta e Miguel.
* Afonso, irmão de Linda, possui o mesmo espírito alegre e conquistador do pai Luís, acaba gostando de Berta (sem saber ser esta  sua irmã de sangue).

Jão Fera ou Bugre - terrível homem, de feições assustadoras e fama de matador profissional (que na verdade é), segundo uma interpretação do livro podemos considerar que a vida o tornou assim (foi cheio de desilusões e sofrimentos). Era apaixonado por Besita, porém apesar de seu desejo a tinha como “santa” e queria apenas sua felicidade, pois sabia que ela não o amaria como ele. Assim quando Luís Galvão se recusou a casar com ela, ele rompeu a “amizade” que os unia, protegia Besita de tudo, porém ela foi assassinada e ele passou a cuidar de Berta e prometeu vingança a sua amada.
Brás - um sobrinho de Luís Galvão sofria de ataques epiléticos e era retardado mental, na casa grande sua presença era desprezada. Ele apaixonou-se por Berta que nunca o distratara e propôs-se a ensinar-lhe o abecedário e rezas. Numa das lições ele se encantara pelo acento til porque o compara à sobrancelha de Berta e conseguiu memoriza-lo.  Assim Berta teve uma resolução seu apelido para Brás seria Til e a partir dai foi ensinando as letras com associações a coisas ou pessoas que o idiota conhecia.
* Zana – negra que trabalhava para Besita e presenciou toda a história de Berta e do assassinato de sua mãe, por isso enlouquecera e todos os dias repetia suas ações no dia da morte de Besita (reproduzindo os fatos daquele fatídico dia).
* Barroso ou Ribeiro – casou-se com Besita, mas na noite de núpcias a abandonou para resolver negócios relacionados a uma herança que recebera. Partiu e ficou longe por alguns anos, quando voltou a sua casa viu sua esposa com um bebê, planejou sua vingança (que incluía a morte de Luís, Besita e sua filha), matou a esposa, mas foi impedido de matar o bebe por Jão Fera.
* D. Ermelinda – esposa de Luis Galvão, muito elegante e educada, mas não muito bela. Ao descobrir sobre o passado de seu marido se entristece, mas quando ele confessa (no final do romance) ela o apoia a reconhecer Berta como filha.

Romance Regionalista de José de Alencar


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